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Com a palavra a ciência

Cérebro bom pra vida inteira

Você já se imaginou daqui 30, 40 anos? Se ainda não o fez, é bom começar a pensar nisso. Estamos  vivendo cada vez mais graças aos avanços na ciência, alimentação, acesso à informação e  tecnologia, que juntos prolongam nossa vida. De acordo com os dados do Our World in Data, no  Brasil em 1900, a expectativa de vida mal ultrapassava os 29 anos (diferente da Europa, onde era de  42,7 anos, e das Américas, onde era de 41 anos). Ao longo do século XX, houve uma mudança  significativa, e em 1950 já vivíamos em média até os 48 anos. Um salto impressionante! Em 2018, a  expectativa de vida média no Brasil chegou a 75 anos, aproximando-se dos europeus, que viviam em  média até os 79 anos. Se não fosse pela pandemia de COVID-19, que diminuiu a expectativa de vida  em todo o mundo, teríamos avançado ainda mais. Podemos nos orgulhar da nossa persistência em  querer viver mais. Em apenas um século passamos de míseros 29 para 75 anos, apesar da enorme  desigualdade na distribuição de riquezas, acesso à saúde, educação, falta de saneamento e  moradia. Agora, por favor, imagine-se chegando aos 80 anos… Você vai querer chegar lá com  vitalidade, desejo, interesse e curiosidade para aproveitar ao máximo e por um longo tempo ainda,  não é mesmo? Certamente. Ninguém quer chegar aos 80 anos debilitado, com perda de capacidade  mental, sem força motora, deprimido, diabético, com problemas cardiovasculares ou com câncer.  Como você imagina a sua chegada aos 80 anos? 

O MUNDO ENVELHECE MAL, E OS BRASILEIROS?  

Eu preciso dizer isso bem alto: a boa forma nos 80 anos precisa ser planejada, ela não cai do céu! O  aumento da expectativa de vida da população acompanhada de hábitos ruins, como sedentarismo e  má alimentação, excesso de trabalho, estresse tóxico e sofrimento mental, tem provocado uma  mudança significativa no perfil de saúde da população mundial. Se antes as pessoas morriam por  conta de doenças infecto-contagiosas, hoje o que nos mata são as doenças degenerativas. De  acordo com a Organização Mundial da Saúde, atualmente, 74% das mortes ocorrem por doenças 

não transmissíveis, ou seja aquelas doenças decorrentes do estilo de vida. Em países de baixa e  média renda como o Brasil, esse número salta para 86%. Pense bem, o estilo de vida e nossos  hábitos estão acabando com nosso cérebro e coração, estão nos adoecendo e nos matando.  

Estamos vivendo uma epidemia de doenças crônico-degenerativas, como as mentais,  cardiovasculares, diabetes e câncer. No Brasil, de acordo com a Pesquisa Nacional de Saúde de  2019, 52% das pessoas com 18 anos ou mais relataram ter recebido o diagnóstico de pelo menos  uma doença crônica. Dos jovens estudantes brasileiros, 71% já tiveram burnout, e a doença mental  assola tanto eles quanto os adultos, como escrevi no artigo anterior a esse. A hipertensão se  espalhou em 30% da população, e muitos não são tratados. Se isso não bastasse, há também o fato  preocupante de que, em 2019, como aponta a Federação Internacional de Diabetes, 46% dos 16,7  milhões de brasileiros com a doença ainda não haviam sido diagnosticados e, portanto, não estavam  em tratamento.  

Não estamos isolados, esse quadro é mundial. Se quisermos de fato envelhecer melhor e com mais  saúde, o que é não é uma utopia, teremos que mudar profundamente. Primeiro mudar nosso estilo  de vida e as crenças que nos sabotam. Precisamos mudar de hábitos! Depois, precisamos eleger  governos comprometidos com políticas públicas para uma melhor distribuição de riqueza,  saneamento, trabalho e educação para todos. E não é só isso não. Há uma necessidade urgente de  nos apaixonarmos pela proteção da natureza e todo tipo de vida no planeta, seja ela animal, vegetal  ou mineral. Precisamos humanizar nossos corações e mentes e cuidar da natureza, porque sem ela  não haverá boa velhice. O que adianta viver longamente, miseravelmente ou não, num mundo  padecido de verde, de ar, de vida, de luz, de água? 

AH, MAS A VELHICE DEMORA! EU TENHO TEMPO  

Segundo a Dra Ana Cláudia Arantes, o envelhecimento começa no momento em que o corpo  alcança seu ápice, e isso se dá por volta dos 25 anos. Por favor, cai na real! Depois dessa marca, o  organismo começa a perder reserva funcional. Se é verdade que, ao envelhecermos vamos ficando  mais susceptíveis a determinadas doenças, isso não é um absoluto.  

Quando eu tinha 15 anos, no auge dos meus treinos de voleibol no Praia Clube de Uberlândia, minha  cidade natal, eu me lembro bem como eu via pessoas nos seus 60 anos. Para mim elas eram idosas,  já tinham perdido muitos dentes e usavam próteses, tinham problemas nas articulações, viviam uma  vida reclusa em suas casas, se vestiam sem estilo, já eram medicadas por vários tipos de  adoecimentos e seus cérebros estavam proporcionalmente sem vitalidade. De modo geral, essas  pessoas não tinham viço e nem energia. Hoje isso é impensável! Existe um movimento vibrante de  60+ com pessoas ativas nas suas casas, nos esportes, nas artes, se cuidando nas academias e  com dentes na boca! Sério! Eu tenho 64 anos e me sinto como uma mulher de 64 anos, ou seja,  viva, ardente, me fazendo perguntas, animada, trabalhando, malhando, me revoltando as vezes,  meditando, descobrindo novas formas de viver, com muita saúde, e zero medicamento! Minha idade  biológica pode ser bem menor que a cronológica, mas eu não sou aquela mulher de 60+ que se  sente como se tivesse 30. Não, isso é uma bobagem, é antigo, é uma crença rota, presa ainda lá  atrás quando não se imaginava que uma pessoa mais velha pudesse estar plena exatamente em sua  idade cronológica! 

Um escritor chamado Mathias Énard em seu fabuloso livro Bússola, que estou relendo agora, diz algo  assim: “A vida é uma sinfonia de Mahler, nunca volta atrás, nem cai no mesmo lugar (..) não há 

escape possível da consciência do tempo”. E eu digo inspirada nele que, o tempo se impõe sobre  essa nossa fuga da finitude. É isso. Na boa gente, precisamos estar no nosso tempo e saber que ele  é finito. Se quisermos mesmo viver muito e muito bem, temos que fazer algo por nosso cérebro,  mente e coração já. 

Quando o cérebro cai, tudo cai. Você pode viver sem gônadas, mas não sem cérebro. A constante  exposição ao estresse tóxico corrói nossas estruturas biológicas e emocionais, e o desfecho  inconveniente disso é o envelhecimento precoce do nosso cérebro.Não importa se a pessoa é jovem  ou não, seu cérebro pode estar vital até o fim. Não há nada nos cânones médicos que afirme o  contrário.  

Ninguém precisa envelhecer perdendo função cerebral. Há 40 anos ensinava-se nas escolas de  odontologia que as pessoas precisariam de dentaduras aos 60 anos! Juro, acredite você, eu ouvi  isso na minha formação. Sabemos que isso não é verdade, assim como não é verdade também  esperar por um cérebro sem vida na nossa velhice!  

Mas, o estilo de vida pode ser o pântano ou o oásis. Se você deixar o tempo passar e não se  responsabilizar por sua saúde, talvez o cérebro que você tem agora não esteja com você ali na  frente. 

Eu acredito que quando conhecemos algo e nos apaixonamos, a gente cuida porque a gente ama. Vamos nos apaixonar pelo cérebro? Ah, então tá, nos vemos na próxima semana!

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