Você sabe, aquela vozinha irritante na sua cabeça que não para de falar, te bombardeando com pensamentos intrusivos e te fazendo sentir parte de um ciclo sem fim? Sabe quando você não tem controle desse impulso que te toma por dentro, fazendo você organizar, alinhar infinitamente tudo? Estamos aqui para falar sobre o TOC, o Transtorno Obsessivo-Compulsivo, que é um transtorno de saúde mental caracterizado por pensamentos, imagens ou impulsos recorrentes, indesejados e
intrusivos (obsessões) que causam angústia e ansiedade significativas. O TOC pode atrapalhar o seu dia a dia, te empurrando para esses rituais peculiares, que te dão apenas um alívio temporário. Eu trago boas notícias! Vamos explorar como você pode assumir o controle mínimo sobre o TOC, e desta maneira ganhar uma folga para respirar e relaxar em sua rotina diária. Eu sei que será uma uma caminhada longa, e sei também o quanto pode ser difícil lidar com a montanha-russa emocional, os estigmas e os mal-entendidos que recaem sobrem quem sofre com o TOC. Mas, existem alguns recursos na meditação que podem ajudar, e estamos juntos para explorar esse ideia. Vem comigo!
Como eu já enunciei acima, o Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) é uma condição de saúde mental caracterizada por pensamentos, imagens ou impulsos recorrentes, indesejados e intrusivos, que são denominadas obsessões, e que causam angústia, muita ansiedade e sofrimento mental. Essas obsessões geralmente levam a comportamentos repetitivos ou atos mentais realizados para reduzir a angústia causada pelas obsessões, que são conhecidas por compulsões. Veja você, um ciclo vicioso: a pessoa é tomada por uma série de disparos mentais na forma de pensamentos ou imagens de forma obsessiva, e para lidar com a ansiedade e angustia que resulta desse aprisionamento mental, ela tenta dar vazão agindo compulsivamente de modo a obter um alívio.
Mas, as compulsões proporcionam apenas um alívio temporário, e o ciclo de obsessões e compulsões pode se tornar contínuo e prejudicar o funcionamento do corpo e da mente, resultando em mais sofrimento mental, adoecimento mental e desgaste do sistema nervoso central, o cérebro. As obsessões comuns no TOC incluem o medo de contaminação, de causar danos a si mesmo ou a outros, as dúvidas sobre a realização correta de determinadas tarefas e problemas com assimetria. As compulsões podem envolver comportamentos como lavagem excessiva das mãos, checagem, contagem ou rituais mentais como rezar ou repetir frases silenciosamente.
O TOC pode estar relacionado a problemas na comunicação entre a parte frontal do cérebro e as estruturas mais profundas, que utilizam o neurotransmissor serotonina. Embora as causas exatas do Transtorno Obsessivo-Compulsivo (TOC) ainda sejam desconhecidas, estudos indicam que a herança genética não explica, isoladamente, o surgimento desse transtorno.
O TOC é um transtorno relativamente comum. Ele afeta pessoas de todas as idades, etnias e extratos socioeconômicas. A prevalência do TOC está estimada em cerca de 3% da população. Para o Brasil, isso significaria algo em torno de 6.420 milhões de casos. Se comparada à prevalência de ansiedade, que acomete mais de 19 milhões de pessoas em nosso pais, o TOC se torna o 4º diagnóstico mais comum, depois da ansiedade, de transtornos relacionados a substâncias e do transtorno depressivo maior. Nunca é demais lembrar que, essas outras doenças mentais podem surgir em pessoas com TOC em decorrência do sofrimento que essa condição impõe.
A coisa é séria e, em razão da estigmatização, as pessoas portadoras do TOC não buscam ajuda, e acabam vivendo com seu problema isoladamente. O atraso na busca de tratamento está, geralmente, associado ao constrangimento, vergonha ou falta de conhecimento sobre a natureza de seus sintomas. Mas, viver com o Transtorno Obsessivo-Compulsivo pode ser desafiador e afetar vários aspectos da vida de uma pessoa.
O TOC pode ter início em qualquer idade, mas geralmente começa durante a infância, a adolescência ou o início da vida adulta. A idade média de início é, em geral, por volta dos 19 anos de idade. Na infância, acredita-se que o TOC afete igualmente meninos e meninas. Já na adolescência e a idade adulta, parece ser mais comum em homens do que em mulheres. O TOC pode prejudicar significativamente o funcionamento diário, a vida social e o desempenho ocupacional de uma pessoa. A natureza angustiante das obsessões e os comportamentos compulsivos podem interferir nos relacionamentos, no trabalho e na qualidade de vida em geral.
A abordagem terapêutica convencional sugere uma combinação de medicação psiquiátrica e terapia comportamental para tratamento do TOC, porém, como os resultados não se mostraram assim tão animadores, estudos recentes recomendam a inclusão da meditação no protocolo terapêutico. É importante observar que os planos de tratamento devem ser individualizados com
base na gravidade dos sintomas, nas preferências individuais e na experiência dos profissionais de saúde mental.
O tratamento medicamentoso de primeira opção recomendado consiste na administração de inibidores seletivos da recaptação de serotonina (ISRSs), uma classe de fármacos utilizada no combate à depressão. Você já deve ter ouvido muito o nome de alguns deles: fluoxetina, paroxetina, escitalopran, fluvoxamina, citalopram e sertralina. Uma vez estava dando uma palestra para uma turma de Odonto na UFMG, e pedi que levantassem a mão aquelas pessoas que usavam sertralina, claro que eu esperava muitas mãos, mas para meu espanto, quase a turma toda se manifestou. Quase todos usavam esse antidepressivo, sendo que muitos usavam ainda a ritalina para melhorar o foco e a atenção.
Essas drogas representam uma categoria de antidepressivos que visam atenuar os sintomas do Transtorno Obsessivo-Compulsivo ao influenciar os níveis de serotonina presentes no cérebro. Apesar dos benefícios, é importante notar que menos de 20% das pessoas conseguem alcançar a remissão completa dos sintomas do TOC mediante o tratamento medicamentoso. Além disso, é comum que os efeitos colaterais associados possam gerar muito desconforto, levando algumas pessoas a interromper a terapia. Tais efeitos secundários abrangem uma variedade de sintomas como náuseas, desconforto abdominal, sonolência, por vezes insônia, agitação, cefaleia, disfunção sexual, vertigens e ganho de peso. Mas, de todos os inconvenientes talvez o pior seja o fato de que, quase 90% das pessoas acabam tendo recaídas nos quatro primeiro meses após a interrupção da medicação. Ou seja, resultados não são muito alentadores.
Outra perna do protocolo de tratamento do TOC é a terapia cognitivo-comportamental (TCC). Esse método envolve a técnica de Exposição e prevenção de resposta, que consiste em expor a pessoa a situações gatilho, confrontar então os pensamentos de obsessão e, ao mesmo tempo, resistir ao impulso de realizar comportamentos compulsivos. Em outras palavras, coloca se a pessoa em situações deliberadas que induzam a ansiedade e as treina a tolerar e gerenciar isso, o que eu considero bastante problemático dada as vulnerabilidade emocional da pessoa com TOC. A Terapia cognitivo-comportamental, que se concentra em analisar como os pensamentos de uma pessoa podem influenciar suas crenças, atitudes e comportamento mostra que, 70% dos pacientes apresentam uma redução significativa dos sintomas, mas somente 30% deles eliminam por completo os comportamentos exagerados e seus pensamentos obsessivos.
Em razão dos problemas que o formato terapia/medicação apresenta, há uma necessidade de melhorar muito a abordagem terapêutica. Os resultados deste protocolo são muito insatisfatórios em termos do controle mínimo desse transtorno. Em 2005, surge a publicação de um estudo sobre o TOC, que advertia para a necessidade de um começo totalmente novo em termos do tratamento do TOC, uma vez que a combinação de medicamentos fortes com terapia comportamental-cognitiva apresentava, e ainda apresenta, uma taxa de resposta muito baixa e com pacientes refratários aos tratamentos.
Justamente dentro desse apelo por um novo começo que o pesquisador e psiquiatra David Shannahoff-Khalsa, diretor do grupo de pesquisa para Dinâmicas Mente-Corpo da Universidade da California San Diego, surge. Ele introduz novos protocolos de meditações do Kundalini Yoga para o tratamento do TOC, referendados por resultados de duas pesquisas clínicas realizadas
por sua equipe no final dos anos 90. E foi assim que, algumas meditações foram usadas nos protocolos de tratamento do TOC, inclusive como primeira opção quando os sintomas eram suaves, ou combinado com as terapias convencionais medicamentosas e psicológicas quando os sintomas eram mais fortes. Os resultados foram animadores, como mostro a seguir.
Acredito que a meditação possa realmente fazer a diferença, tanto por sua interferência positiva na regulação das funções cerebrais, quanto na abertura que ela promove de se conhecer mais o funcionamento da mente o que a torna uma ferramenta comprovadamente eficiente na auto regulação emocional.
Em 2019, um grupo de pesquisadores liderados pelo mesmo Dr Shanahoff-Khalsa e o Dr Rodrigo Yacubian Fernandes, do instituto nacional de psiquiatria para criança e adolescente do departamento de psiquiatria da Faculdade de Medicina da USP, conduziram na USP um dos estudos recentes mais importantes sobre o uso de protocolos de yoga e meditação para tratamento do TOC. Os resultados publicados pela revista Frontiers em Psiquiatria podem ser vistos aqui. Eles compararam o uso de um protocolo de meditação do Kundalini Yoga com a resposta do relaxamento de Benson e Wallace, que consiste, resumidamente, no relaxamento progressivo do corpo com o uso de um som ou palavra que se repete. Os resultados deste trabalho apontam que, o protocolo de kundalini yoga de meditação foi mais eficaz se comparado à resposta do relaxamento para o tratamento do TOC, e provaram ser mais eficaz por manterem a redução dos sintomas com o passar do tempo. Vale dizer que este protocolo foi testado em pacientes do Departamento de Psiquiatria da USP que faziam uso de medicação psiquiátrica, que foram orientados a não aumentarem a dose durante os testes. Seira permitido apenas diminuir as doses de medicação durante a pesquisa. Esses pacientes não estavam em terapia cognitivo-comportamental. Esse protocolo de meditação não foi testado em pacientes sem uso de medicação.
Não existe milagres. Nessas abordagens mente-corpo é necessário um engajamento, constância e muita disciplina para se manter as práticas. Talvez, por isso mesmo, o desafio é maior se comparado à ingestão de uma pílula pura e simplesmente, que alivia temporariamente os sintomas. Mas, diante de todo os efeitos colaterais da medicação para o TOC, associar a meditação junto aos protocolos de psicoterapia pode fazer a diferença na cura desta doença. A hipótese é que, na medida em que a pessoa incorpora a meditação como parte do seu estilo de vida, ela vá obtendo melhoras significativas e pode, assim, parando com a medicação.
O tema é de tamanha importância que eu convidei para uma conversa comigo, o Dr Rodrigo Yacubian no meu podcast desfragmento. Vamos falar sobre seu importante trabalho com a meditação. Sempre importante lembrar que na semana seguinte à publicação deste artigo aqui no blog e do podcast faremos uma meditação para o TOC. Fiquem de olho!