Hoje, vamos viajar pelo reino das gorduras, destacando sua relevância como superalimento, e com ênfase no coco, muitas vezes tão incompreendido!
Nossa evolução permitiu a seleção de genes com uma nobre missão: acumular gorduras, dentre elas, o colesterol. Em 2 milhões de anos, o cérebro humano deu um salto alcançando 1,5 kg na vida adulta. Para se ter uma ideia, um terço da energia consumida por um recém-nascido é usada apenas para nutrir seu crescimento cerebral – o bebe estoca gordura. As gorduras são essenciais. Além de fornecerem energia, elas moldam a estrutura cerebral que compõe-se por 60% de gordura! Neste enredo fisiológico, surge um gene responsável pelo acúmulo da gordura em nosso corpo, o apoE-4. Injustamente a imprensa o rotulou como a variante assassina, atrevida generalização derivada dos altos índices de doenças coronarianas associadas à gordura. Mas, os pesquisadores alertam que a genética é apenas um ator dessa cena, enquanto o verdadeiro protagonista no desfecho das cardiopatias é o ambiente. Somos, dentre os mamíferos, os que mais sofrem de doenças coronarianas, e está provado que isso se deve ao sedentarismo e à alimentação equivocada. Hoje, vamos viajar pelo reino das gorduras, destacando sua relevância como superalimento, e com ênfase no coco, muitas vezes tão incompreendido!
Os dados não são nada animadores. Segundo o atlas da Federação Mundial da Obesidade de 2023, 51% da população mundial estará obesa em 2035, e o pior é que a obesidade já cresce solta entre crianças e jovens.
As consequências da obesidade são bem conhecidas, mas é sempre bom alertar que o excesso de peso está diretamente relacionado às doenças coronarianas, diabetes, hipertensão e ao risco aumentado para acidentes vascular cerebral. Mas, preciso dizer que, nem sempre a gordura é a vilã, e os fatos estão dados: na medida em que a população vem se tornando sedentária e abraçando um padrão de alimentação péssimo, estimulada pela própria industria do alimento que impunimente
coloca seus péssimos produtos nas gôndolas de supermercados, com excesso de açúcar, gorduras trans, sódio e outros químicos, as doenças se tornam inevitáveis. A transferência da culpa para a genética é uma desonestidade científica.
Neste sentido, um alerta importante foi dado pela equipe do Dr. Templeton nos idos de 2008: “os genes explicam apenas 7% do risco de desenvolver doenças coronarianas, os outros 93% dependem de fatores ambientais determinados pela dieta e estilo de vida. Não faz sentido tratar o colesterol, a boa medicina precisa se dedicar ao ser humano e seu meio social, isso é complexo e difícil mas, necessário”.
As gorduras, chamadas de lipídeos, estão presentes em produtos de origem animal e vegetal. Quando você ingere um alimento que contem gordura, ela é quebrada em partes pequenas chamadas ácidos graxos, que são essenciais para nossa vida.
Os ácidos graxos se dividem em dois grupos, os saturados e os insaturados. As gorduras insaturadas se subdividem em monoinsaturada, presentes no azeite de oliva extra virgem, nozes e castanhas, abacate, e poliinsaturadas, presentes nos peixes oleosos, linhaça e chia. Vale a pena mencionar dois grupos importantes de gordura poliinsaturada, o omega 3 (presente nos peixes oleosos, linhaça e nozes) e omega 6 (presente nas nozes, semente de girassol e amendoim) que não são produzidos no corpo e por isso precisam vir da alimentação ou da suplementação. As gorduras saturadas são aquelas que, em geral, devem ser ingeridas moderadamente. Elas estão em alimentos como carnes, gordura aparente de carnes, manteiga, ovo e produtos do leite. Entretanto, devo dizer que, há grande controvérsia sobre as gorduras saturadas como as vilãs da nossa alimentação. Alimentos como os queijos curados e o óleo de coco e palma que estão nesta categoria, não fazem o mal imaginado, pelo contrário. As pesquisas nutricionais atuais revelam, por exemplo, que os queijos curados em seu processo de maturação de pelo menos 30 dias tem suas gorduras quebradas em cadeias curtas e médias, o que aumenta muito seu valor nutricional. Além disso, suas proteinas, originalmente muito anoveladas se tornam de melhor digestibilidade no processo da cura. Seu consumo, entretanto, não deve ser exagerado. Há também os ovos, que já foram considerados vilões e hoje, em razão de sua boa propriedade nutricional, chegam à mesa pra ficar! Eles são ótima fonte de proteína, um excelente substituto das carnes, rico em vitaminas (colina, acido fólico, riboflavina, vit A,K, B6, B12) e minerais (zinco, glacio, selênio, fósforo e ferro), contudo não devem ser comidos fritos em óleo ou manteiga para evitar sua transformação em gordura trans. O que você pode fazer é fritá-los em agua ou em frigideira antiaderente (sem teflon!). As gorduras Trans devem sair de vez de sua mesa porque elas não são necessárias em nada no seu organismo e são as piores gorduras em todos os sentidos. Ela é um tipo de gordura industrializada, no qual o óleo líquido é transformado em sólido diminuindo seu custo e tornando-a barata. Ela aumenta a crocância nos alimentos, melhora o sabor e estende o prazo de validade de produtos. Esse tipo de veneno está presente nas margarinas, biscoitos, batatas fritas prontas ou congeladas, sorvetes, salgadinhos e alimentos ultra processados.
O Colégio Americano de Cardiologia adverte que devemos “consumir uma dieta saudável baseada em plantas ou semelhante à dieta mediterrânea, rica em vegetais, frutas, nozes, grãos integrais, proteínas magras vegetais ou animais e fibras”. Em outras palavras, devemos eliminar o açúcar, adoçantes, carboidratos ruins e gorduras trans de nossas vidas. Diminuir a ingestão exagerada de gorduras saturadas, sódio, carne vermelha e evitar a carne processada (como bacon, salame, presunto, cachorro-quente e salsicha) faz parte dessa advertência.
O debate está colocado nos meios acadêmicos e a questão em discussão é: será a gordura saturada realmente a causadora das doenças coronarianas. Essa conversa acadêmica é importante porque revela que há evidências científicas e clínicas notórias que apoiam a ideia de que as gorduras saturadas, em si, não podem ser apontadas como as causadoras das cardiopatias. Um estudo de metanálise publicado em 2015 no British Medical Journal pela cardiologista Aseem Malhotra mostra que, todos os dados existentes até então não apoiam a ideia de que gorduras saturadas seriam as causadoras diretas do aumentado risco de doenças cardiovasculares. O estudo que deu origem à crítica à gordura saturada foi elaborado por Keys, e publicado em 1953 sob o titulo Atherosclerosis: a problem in newer public health. Nesta pesquisa, ele utilizou uma base de dados de 22 países para sua pesquisa, porém, deste universo, ele pinçou os dados apenas de seis países justamente porque estes mostravam uma associação positiva do consumo de gordura saturada com a mortalidade por doença cardíaca degenerativa. Lamentavelmente, ele deixou de fora de sua análise dados de 16 outros países que não se alinhavam com sua hipótese, ou seja, nesses países os dados não revelavam nenhuma relação entre o consumo de gordura saturada com as cardiopatias. Os resultados decorrentes desse estudo parecem ter nos direcionado para uma abordagem dietética equivocada por décadas, afirma os pesquisadores.
Mais recentemente, o editorial do OpenHeart, uma organização de acesso livre às pesquisas cardíacas, tece um elogio ao trabalho da Dra Malhotra e segue com uma interessante e completa revisão do tema, concluindo que, “a dieta pobre em gorduras saturadas não tem efeito algum (nem bom, nem ruim) sobre a saúde o coração, e o medo generalizado de que a gordura saturada aumente o colesterol é infundado, ja que o LDL (low-density lipoprotein) piora quando se retira a gordura e a substitui por carboidratos”.
Um estudo randomizado chamado de Predimed, com vistas à prevenção de doenças cardiovasculares indica que houve redução significativa de doenças cardiovasculares utilizando a dieta mediterrânea, se comparado à dieta de baixo teor de gordura. Outro estudo, o Dieta de Lyon, confirma que a dieta mediterrânea reduz a mortalidade em geral, e a mortalidade por doenças cardiovasculares em particular. Vale lembrar que a dieta mediterrânea é baseada em plantas, mas não exclui da alimentação gorduras saturadas presentes em queijos, iogurtes e ovos.
O óleo de coco é um alimento que está presente desde tempos imemoriais na mesa de países do sudeste asiático e Índia, sendo responsável pela maior parte de calorias diárias dessas populações. Curiosamente, esses países apresentam índices muito baixos ou inexistentes de doenças cardiovasculares.
O óleo de coco é um produto artesanal de cooperativas, que não pode ser produzido em larga escala como soja e canola, e por isso mesmo é mais caro. Admito que, existe um exagero nas propagandas do óleo de coco, o colocando como uma panaceia para muitos males, inclusive para o emagrecimento. Isso não é verdade, mas nem por isso substituí-lo por óleos poli-insaturados industrializados faria bem, como indica este estudo Cohort.
Sabemos pela literatura que, os óleos industrializados estão relacionados ao aumento do colesterol ruim, da obesidade e do aumento da inflamação. Além disso, seu uso está documentado em análises que descartam, ou questionam severamente, a ideia de que a troca de gordura saturada, como a do oleo de coco, por carboidratos ou óleos poli-insaturados seja a solução, vejam alguns resultados da pesquisa de James DiNicolantonio sobre isso.
O resumo da pesquisa feita na Polinésia com duas populações que vivem em atóis próximos ao equador oferecem uma oportunidade para investigar os efeitos da gordura saturada e colesterol dietético (miúdos, crustáceos e moluscos) na determinação dos níveis de colesterol sérico. Esse artigo afirma que, “as dietas habituais dos habitantes dos atóis de Pukapuka e Tokelau são ricas em
gordura saturada, mas baixas em colesterol dietético e sacarose”. O coco é a principal fonte de energia para ambos os grupos. Os tokelauanos obtêm uma porcentagem muito maior de energia do coco, 63%, do que os pukapukanos, 34%, e isso se reflete nos níveis de colesterol sérico dos tokelauanos que são de 35 a 40 mg mais altos do que nos pukapukanos. A análise de uma variedade de amostras de alimentos e biópsias de gordura dessas pessoas evidencia um alto teor de ácido láurico (12:0) e mirístico (14:0), presentes no coco. Entretanto, a doença vascular é incomum em ambas as populações, e não há evidências de que a alta ingestão de gordura saturada tenha efeitos prejudiciais nessas populações.
O Professor Grant Schofield da Universidade de Tecnologia de Auckland conduziu pesquisas sobre os hábitos alimentares de diversos países do pacífico, incluindo Tonga, Tokelau, Kiribati e Vanuatu e comparou as dietas tradicionais de algumas dessas ilhas com a dieta tipicamente ocidental, ricas em açúcares e carboidratos ruins, adotadas por outras ilhas da região. Ele adverte que considerar restringir o uso de coco e seus derivados naturais como forma de restringir gordura saturada não pode ser sustentada com fatos clínicos já que, quando analisadas as populações que tradicionalmente usam o coco, não pôde ser identificado nenhum tipo de adoecimento possivelmente relacionado ao consumo da gordura saturada do coco. Para ele, o problema de fato se circunscreve à dieta rica em açúcares e carboidratos. Afinal, a dieta americana clássica que recomenda mínima quantidade de gorduras saturadas e mais poli-insaturadas e carboidratos, fez com que o país atingisse níveis inadmissíveis de diabetes tipo 2 e obesidade, causando diretamente o adoecimento do coração, segundo ele.
Eu me debruçava sobre um estudo do sudeste asiático que comprova não haver associação entre o consumo de óleo de coco (com seus altos indices de acido saturado tipo palmítico, láurico e mirístico) às alterações dos níveis de hemocisteina e outros marcadores para inflamação, quando me deparei com outro estudo de 2021.
Nesse importante artigo de 2021, os autores esclarecem sobre o coco como um alimento funcional, sendo sua utilização muito saudável para consumo humano. Da leitura desse trabalho se depreende que, o óleo de coco é uma rica fonte de ácidos graxos de cadeia média. Mas não só isso, além de ser utilizado na culinária, o óleo de coco tem chamado a atenção por suas propriedades hipocolesterolêmicas (não causa aumento do colesterol ruim), anticancerígenas, anti hepatosteatóticas (não causa aumento da gordura do fígado), antidiabéticas, antioxidantes, anti inflamatórias e antimicrobianas.
Apesar de todos esses benefícios para a saúde, o consumo de óleo de coco ainda é subestimado, mesmo frente às inúmeras evidências científicas que comprovam o impacto favorável do seu uso na saúde cardíaca e no perfil lipídico sérico. A polpa do coco contem fibra, proteína e minerais como ferro, manganês, cobre e magnésio. Por ser rico em triglicérides de cadeia média, gordura saturada fácil de ser digerida pelo organismo, proporciona energia instantânea aos músculos e ao cérebro e aumenta o foco sem produzir picos de glicose no sangue. Para a redução de massa gorda no organismo, o seu consumo deve ser alinhado à prática regular de exercícios físicos e à uma drástica redução do uso de carboidratos ruins e açúcares.
Na minha alimentação, eu reservo espaço de honra para o coco e seus derivados. Fiquem ligados porque em breve vou compartilhar algumas deliciosas receitas de preparo rápido, como estou acostumada na minha cozinha!