A longevidade da vida depende essencialmente da nossa capacidade de transformar muito além dos modelos fossilizados de crença que seguimos. Quando usamos um determinado molde e percebemos que ele ficou apertado, é essencial mudar. Foi exatamente isso que manteve a vida como um evento bem sucedido na Terra. Mudar tudo em nós – forma, espécie, gênero, crenças – é o que garante o drama necessário para a vida neste planeta. Fluir com curiosidade e leveza é essencial. Isso requer destemor, eu sei. As mudanças são desafiadoras porque o desconhecido dói. Um modelo de crença é útil porque dá segurança, mas é inútil porque tira a vida!
“Descendente dos macacos! Meu querido, vamos torcer para que isso não seja verdade, mas ser
for, vamos rezar para que a notícia não se espalhe”.
Comentário atribuído à mulher do Bispo de Worcester,após a publicação da Teoria de Darwin sobre a evolução.
A ideia da nossa origem é perturbadora e logo se ramifica em mil indagações nos meios populares e acadêmicos, dentre as quais, em minha opinião, as mais comuns são: quem sou eu? Como cheguei aqui? Sou produto inexorável dos genes que herdei? Nossa, e agora? Desde Darwin que esse papo causa frisson até que, nos anos 70, uma ideia bem incômoda foi posta à mesa nos arrogantes e cheios de certezas reinos acadêmicos. Em 1977, a revista Developmental Biology publica um artigo sob o título “Análise estrutural minuciosa de células normais e moduladas em diversas culturas miogênicas” que viria abalar o sistema de crença da biologia. Bruce Lipton, o autor, atingiu como uma flecha o coração do sistema de crença da biologia criado por Darwin e revisitado por Crick e Watson em 1958, que ficou conhecido pelo nome “dogma central”.
Seu experimento não poderia ser mais modesto, aliás, as coisas geniais são sempre simples. Ele colocou numa placa petri células idênticas vindas de uma mesma célula mãe. Em cada uma dessas placas foi adicionado um substrato diferente para alimentar e fazer crescer as células. Neste ponto minha avó diria – ah mas que bobagem, pra que isso? Claro que não há milagre não, as células que nascerem de uma mãe serão filhas dela, filhas da mãe ora!
Mas não foi isso que aconteceu. Para espanto, um grupo de células virou neurônios, outro hemácias, outro hepatócitos, e outro células cardíacas! Lipton dá os primeiros passos na epigenética, e com esse experimento prova que o meio ambiente, e não o DNA, é o mais importante para a criação de novas gerações.
Nós só chegamos até aqui, seja lá como chegamos, por acreditamos em algo. Um conjunto de valores (princípios), que nos coloque nos trilhos da vida e nos ajude a entender o mundo à nossa volta, é essencial para essa evolução. O nome disso é sistema de crença, que existe tanto na ciência quanto na vida das pessoas.
O sistema de crença é poderoso porque fornece certas convicções e isso é ótimo para dar segurança o suficiente para prosseguirmos confiantes vida afora. Vamos tomar o exemplo de uma pessoa casada: por mais difícil que seja essa relação, ela em si oferece um eixo pelo qual tudo se organiza. Assim, uma pessoa casada pensa como uma pessoa casada em relação aos filhos, ao companheira/o e ao mundo. Isso é muito útil quando a pessoa oscila em manter-se na relação diante dos conflitos inerentes a mesma. Essa pessoa sempre terá um valor maior que a fará prosseguir na superação das dificuldades e permanecer casada.
Parece lindo e perfeito mas esse sistema de crença também pode matar. A pessoa casada que “tem de se submeter àquele molde” simplesmente por imposição da crença, arrisca perder-se de si na medida em que deixa de ser ela, de ouvir suas necessidades e desejos para viver enquadrada. Isso causa um dano inimaginável à identidade, mata a pessoa. O sistema de crença alimenta um ciclo contínuo usando uma fórmula antiga entabulada por Demócrito, o pai da ciência clássica, que afirma “o que você vê é o que existe”. Este molde sedutor será responsável por tornar Newton o soberano da moda prêt-à-porter da ciência, que excita salões acadêmicos, revistas, conversas de mesa de bar e as rodas de família desde então. Crer que só é real aquilo que se vê é uma maneira de trazer ao mesmo tempo paz e demência, segurança e loucura.
Por sorte um francês muito descolado nascido em 1596 chamado Descartes viria deslocar muitas certezas sobre o esse molde prevalente. Ele insistia no tal do campo, da mente como força geradora de realidades e de vida. Ele contestou as idéias Newtonianas e tentou incluir no molde da origem da vida, a energia mas, francamente sem sucesso. Apenas no início do séc. 20 cientistas da Mecânica Quântica entenderam o que ele dizia.
“Eu considero a consciência fundamental. Eu considero a matéria como derivada da consciência”.
Max Planck, Nobel Física 1918.
Um corpo humano tem algo em torno de 37 trilhões de células, cada uma delas com voltagem de 1,4 que juntas podem gerar 518 trilhões de volts. Somos uma usina! Essa energia interage em campos abertos e fechados. Isto é, podemos usar essa energia internamente ou podemos usá-la para entrar em contato com tudo que existe lá fora. Somos um campo interagindo com outros campos. Deste modo, o DNA não é nossa identidade, ele é nosso potencial.
Há um campo, há a percepção deste campo e nossa resposta vai definir se os genes que herdamos totalmente perfeitos poderão gerar um câncer a depender do meio (físico, químico, emocional, mental). Outros genes que herdamos já defeituosos, dependendo do meio jamais manifestarão a doença. O campo, a mente são de fato o que determina nossa expressão genética. Se refinarmos nossa percepção do meio interno e externo, formos além dos moldes auto-impostos, poderemos mudar de comportamento e reescrever nossa hereditariedade e destino.
“Seus genes refletem apenas o seu potencial, não o seu destino. Tudo depende das vibrações”
Lipton, em A Biologia da Crença
Relembrando que fluir com curiosidade e leveza é essencial. As mudanças são desafiadoras e necessárias porque permanecer no mesmo lugar, acelera nosso desaparecimento sem deixar rastro de nossa bravura.
Gurusangat, Jan 2023